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Bruno Mendes

Granitos

O perigo espreita em cada esquina, a cada badalada do relógio. Os granitos estão proibidos, caminhar nas ruas é um desporto radical de fraca visibilidade e rendimento baixo. Os espaços comuns estão alugados a ninguém, e não há quem ouse debatê-lo.

Vivemos enganados. Os granitos são suaves ao toque, as estatísticas mentem ou não passam de números residuais na mecânica do universo.

A mecânica do universo, a bem dizer, nem é inerente ao universo. Os processos são uma construção pessoal e as verdades meras inferências. Não podemos inferir que o perigo espreita em cada esquina. Nunca o experienciamos dessa forma, e mesmo que tal fosse o caso, a experiência individual não é a experiência coletiva.

A verdade é que tu és previsível. A flutuação no teu comportamento é minimal e desprezível, e tu nunca serás o perigo. O perigo, esse, reside em mim.

Queria atribuir a culpa às ruas e aos granitos. Queria desfazer-me da responsabilidade e deixar cair o peso da memória, esconder-me nas praças, recostado sobre a tua imagem distante na minha mente. Mas tu não podes deixar de existir. Tu estás aqui, a meu lado, e não consigo imaginar-te mais.