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Bruno Mendes

Desligar as câmaras

Não gosto de escrever muito depois de me surgir uma ideia ou de assistir a um episódio que mereça reflexão. O tempo é um fator de desgaste que ludibria o pensamento e ofusca os factos, transformando-os numa mentira poderosa, com aspeto de verdade.

Ainda assim, há uma dor que o tempo não consegue atenuar.

São onze horas. A casa está quase deserta. Lá fora, no escuro caído, experimenta-se uma nova sensação. Ao lado, dois corpos que não se conhecem envolvem-se. Não sabem o futuro, mas aproveitam o momento. Não consigo perceber tal ideologia, mas deixo-me hipnotizar.

Oxalá que os filmes não existissem. O subsequente aborrecimento seria um compromisso deveras aceitável em troca de uma visão mais realista e pragmática do amor.

Na cidade, só consigo regressar à festa. Imagino-me de perfil, protagonista. Não interessa se numa rua repleta de bicicletas ou numa aldeia de moinhos. Só consigo ver isso. Só consigo pintar a mulher dos meus sonhos. Bela, não vás. Diz ao realizador para desligar as câmaras e fazer durar o momento.